Passados 44 anos do golpe, todos se apresentam como democratas. Para um jovem, hoje, portanto, sobra sempre a pergunta: "Se todos eram democratas e se opunham à ditadura, quem deu o golpe e quem manteve o regime?
A primeira resposta que lhes virá à cabeça será: "Os militares".
Foi esta a versão que acabou por se firmar. Versão construída e difundida pela grande mídia, com o apoio e a serviço de banqueiros, grandes industriais, monopólios comerciais, grande capital internacional, governo dos EUA e uma série de classes e setores de classes que, juntamente com essa mesma grande mídia, conspiraram contra as reformas de interesse popular defendidas pelo governo do presidente João Goulart. Esse mesmo conjunto de civis que se locupletaram com o regime instaurado em 1964 e o alimentaram.
É certo que setores majoritários da mais alta hierarquia das forças armadas conspiraram lado a lado com aquelas forças, e lhes serviram de braço armado no 31 de março. Além disto, ao longo dos anos de chumbo, militares se prestaram a fazer o "trabalho sujo", reprimindo, prendendo, torturando, assassinando e ocultando cadáveres de opositores. Mas, ainda aí, não estiveram sozinhos: é sobejamente conhecido o financiamento por empresários para a construção e manutenção do aparato repressivo, bem como as denúncias sobre a presença de industriais atuando nas salas de torturas.
Mas nossa elite econômica tem hábitos semelhantes aos de alguns felinos, que costumam ocultar suas imundícies. E um dos seus setores, os oligopólios da comunicação, é o principal instrumento do transformismo.
Com o fim regime, esses oligopólios midiáticos cuidaram de transformar os militares em bois de piranha, enquanto nos bastidores se articulavam para participar, com os seus colegas empresários financiadores do aparato da repressão, do novo banquete. Para isto venderam aos incautos a idéia de que o golpe e o regime foram obra de um estamento (forças armadas), ocultando seu caráter de classe.
Desde sempre golpista, vejamos como a grande mídia se dirigiu ao país em seus editoriais do dia 2 de abril (como o golpe foi desfechado na noite de 31 de março para a madrugada do dia 1º de abril, a maioria dos jornais tratariam o assunto apenas em 2 de abril).
O Globo (RJ)
"Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas (...) para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas (...) o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições. (...) Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente (...) Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. (...) Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.(...) A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo.(...) Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos(...) .
Jornal do Brasil (RJ)
"Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade ... Legalidade que o caudilho não quis preservar, violando-a no que de mais fundamental ela tem. (...) A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas.(...)"Golpe? ノ crime só punível pela deposição pura e simples do Presidente. Atentar contra a Federação é crime de lesa-pátria. Aqui acusamos o Sr. João Goulart de crime de lesa-pátria. Jogou-nos na luta fratricida, desordem social e corrupção generalizada". (1º de abril)
O Estado de Minas (MG)
"Multidões em júbilo na Praça da Liberdade. Ovacionados o governador do estado e chefes militares.O ponto culminante das comemorações que ontem fizeram em Belo Horizonte, pela vitória do movimento pela paz e pela democracia foi, sem dúvida, a concentração popular defronte ao Palácio da Liberdade".
O Dia (RJ)
"A população de Copacabana saiu às ruas, em verdadeiro carnaval, saudando as tropas do Exército. Chuvas de papéis picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava vazão, nas ruas, ao seu contentamento"
Tribuna da Imprensa (RJ)
"Escorraçado, amordaçado e acovardado, deixou o poder como imperativo de legítima vontade popular o Sr João Belchior Marques Goulart, infame líder dos comuno-carreiristas-negocistas-sindicalistas. Um dos maiores gatunos que a história brasileira já registrou, o Sr João Goulart passa outra vez à história, agora também como um dos grandes covardes que ela já conheceu"
O Povo (CE)
"A vitória da causa democrática abre o País a perspectiva de trabalhar em paz e de vencer as graves dificuldades atuais. Não se pode, evidentemente, aceitar que essa perspectiva seja toldada, que os ânimos sejam postos a fogo. Assim o querem as Forças Armadas, assim o quer o povo brasileiro e assim deverá ser, pelo bem do Brasil" (3 de abril)
O Cruzeiro (RJ)
"Sabíamos, todos que estávamos na lista negra dos apátridas - que se eles consumassem os seus planos, seríamos mortos. Sobre os democratas brasileiros não pairava a mais leve esperança, se vencidos. Uma razzia de sangue vermelha como eles, atravessaria o Brasil de ponta a ponta, liquidando os últimos soldados da democracia, os últimos paisanos da liberdade" (O Cruzeiro – revista semanal – 10 de abril)
Já imaginaram se a revista Veja existisse naquela época?
Editorial do jornal Brasil de Fato, de ontem.
A primeira resposta que lhes virá à cabeça será: "Os militares".
Foi esta a versão que acabou por se firmar. Versão construída e difundida pela grande mídia, com o apoio e a serviço de banqueiros, grandes industriais, monopólios comerciais, grande capital internacional, governo dos EUA e uma série de classes e setores de classes que, juntamente com essa mesma grande mídia, conspiraram contra as reformas de interesse popular defendidas pelo governo do presidente João Goulart. Esse mesmo conjunto de civis que se locupletaram com o regime instaurado em 1964 e o alimentaram.
É certo que setores majoritários da mais alta hierarquia das forças armadas conspiraram lado a lado com aquelas forças, e lhes serviram de braço armado no 31 de março. Além disto, ao longo dos anos de chumbo, militares se prestaram a fazer o "trabalho sujo", reprimindo, prendendo, torturando, assassinando e ocultando cadáveres de opositores. Mas, ainda aí, não estiveram sozinhos: é sobejamente conhecido o financiamento por empresários para a construção e manutenção do aparato repressivo, bem como as denúncias sobre a presença de industriais atuando nas salas de torturas.
Mas nossa elite econômica tem hábitos semelhantes aos de alguns felinos, que costumam ocultar suas imundícies. E um dos seus setores, os oligopólios da comunicação, é o principal instrumento do transformismo.
Com o fim regime, esses oligopólios midiáticos cuidaram de transformar os militares em bois de piranha, enquanto nos bastidores se articulavam para participar, com os seus colegas empresários financiadores do aparato da repressão, do novo banquete. Para isto venderam aos incautos a idéia de que o golpe e o regime foram obra de um estamento (forças armadas), ocultando seu caráter de classe.
Desde sempre golpista, vejamos como a grande mídia se dirigiu ao país em seus editoriais do dia 2 de abril (como o golpe foi desfechado na noite de 31 de março para a madrugada do dia 1º de abril, a maioria dos jornais tratariam o assunto apenas em 2 de abril).
O Globo (RJ)
"Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas (...) para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas (...) o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições. (...) Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente (...) Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. (...) Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.(...) A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo.(...) Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos(...) .
Jornal do Brasil (RJ)
"Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade ... Legalidade que o caudilho não quis preservar, violando-a no que de mais fundamental ela tem. (...) A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas.(...)"Golpe? ノ crime só punível pela deposição pura e simples do Presidente. Atentar contra a Federação é crime de lesa-pátria. Aqui acusamos o Sr. João Goulart de crime de lesa-pátria. Jogou-nos na luta fratricida, desordem social e corrupção generalizada". (1º de abril)
O Estado de Minas (MG)
"Multidões em júbilo na Praça da Liberdade. Ovacionados o governador do estado e chefes militares.O ponto culminante das comemorações que ontem fizeram em Belo Horizonte, pela vitória do movimento pela paz e pela democracia foi, sem dúvida, a concentração popular defronte ao Palácio da Liberdade".
O Dia (RJ)
"A população de Copacabana saiu às ruas, em verdadeiro carnaval, saudando as tropas do Exército. Chuvas de papéis picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava vazão, nas ruas, ao seu contentamento"
Tribuna da Imprensa (RJ)
"Escorraçado, amordaçado e acovardado, deixou o poder como imperativo de legítima vontade popular o Sr João Belchior Marques Goulart, infame líder dos comuno-carreiristas-negocistas-sindicalistas. Um dos maiores gatunos que a história brasileira já registrou, o Sr João Goulart passa outra vez à história, agora também como um dos grandes covardes que ela já conheceu"
O Povo (CE)
"A vitória da causa democrática abre o País a perspectiva de trabalhar em paz e de vencer as graves dificuldades atuais. Não se pode, evidentemente, aceitar que essa perspectiva seja toldada, que os ânimos sejam postos a fogo. Assim o querem as Forças Armadas, assim o quer o povo brasileiro e assim deverá ser, pelo bem do Brasil" (3 de abril)
O Cruzeiro (RJ)
"Sabíamos, todos que estávamos na lista negra dos apátridas - que se eles consumassem os seus planos, seríamos mortos. Sobre os democratas brasileiros não pairava a mais leve esperança, se vencidos. Uma razzia de sangue vermelha como eles, atravessaria o Brasil de ponta a ponta, liquidando os últimos soldados da democracia, os últimos paisanos da liberdade" (O Cruzeiro – revista semanal – 10 de abril)
Já imaginaram se a revista Veja existisse naquela época?
Editorial do jornal Brasil de Fato, de ontem.
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